Lanna Holder e Rosania Rocha, pastoras, lésbicas e casadas, desafiam padrões dentro da comunidade religiosa ao liderarem uma igreja inclusiva e compartilharem sua trajetória. Juntas, fundaram a Cidade Refúgio, um espaço que acolhe pessoas da comunidade LGBTQIA+ com fé e respeito.
“Fui namorar com 14 anos meu primeiro namorado e, de cara, posso dizer com todas as letras: eu não me encontrei. Casei com um homem, tivemos um filho, mas eu vivia como se estivesse dentro de uma ‘caixa velada’. Não sabia exatamente o que se passava comigo”, contou Rosania em entrevista a História de Tera.p.i.a. Na época, ela era cantora gospel e já tinha um ministério consolidado.
Lanna Holder, missionária evangélica, teve uma trajetória marcada por conflitos internos. “A minha história era de alguém que dizia ter ‘saído da homossexualidade’. Eu viajava pelo Brasil e pelo mundo inteiro contando sobre a minha conversão e a chamada ‘cura gay’. Aos 10 anos, me apaixonei pela minha professora de redação. Aos 12, me apaixonei por uma colega. Por causa disso, fui convidada a me retirar do colégio. Quando completei 18 anos, saí de casa e fui viver com uma mulher 12 anos mais velha que eu. Nesse processo, minha mãe se converteu ao evangelho e passou a pregar para mim”, relatou. “Por isso, fiz tudo o que achava necessário para deixar de ser quem eu era”, contou.
Quando se conheceram, ambas enfrentavam seus próprios dilemas pessoais e religiosos. “Quando a vi foi algo completamente novo para mim, porque até então eu não tinha tido nenhum envolvimento com uma mulher. Lembro que estava sentada na primeira fileira, e a igreja estava lotada. Quando a vi pela primeira vez, senti algo dentro de mim”, revelou Rosania. “Nós evitávamos qualquer tipo de contato físico, porque eu já percebia que havia uma eletricidade latente entre nós. Por isso, fugíamos muito desse tipo de aproximação”, confessou.
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O amor, porém, foi mais forte que as barreiras. Lanna relatou uma experiência marcante após um grave acidente de carro: “Eu tinha bebido e sofri um acidente. Quebrei quatro costelas, tive dilaceramento do fígado, luxação no fêmur, o pulmão direito esmagado e um trauma cardíaco. Eu quase morri. Quando estava sendo levada para a sala de cirurgia, minha consolidadora me disse: ‘Se você não fizer um voto com Deus de que nunca mais verá Rosania, você vai entrar nessa cirurgia e morrer’. Naquele momento, eu estava desesperada. Meu filho tinha apenas cinco anos, e eu ficava pensando no que Rosania sentiria se eu morresse. Então, fiz um voto com Deus: prometi que, se Ele me tirasse daquela situação de morte iminente, nunca mais veria Rosania.”
Durante o coma, Lanna contou que teve uma experiência espiritual: “Eu me via em um quarto grande e branco, e Ele me dizia: ‘Filha, estou aqui para te perguntar se você quer ir comigo ou se quer ficar’. Deus não me tratou como uma pessoa perdida, rejeitada ou qualquer outro rótulo. Ele me chamou de filha. Quando acordei do coma, disse a Rosania: ‘Eu vivi uma experiência, e tenho certeza de que Deus nos ama e nos aceita como somos'”.
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A partir dessas vivências elas resolveram seguir a relação e assim nasceu a Cidade Refúgio. “É uma igreja que chamamos de inclusiva. Algumas pessoas a rotulam como ‘igreja gay’, mas essa é uma forma equivocada de se referir a ela. O próprio termo ‘igreja’ já significa um espaço que engloba e acolhe a todos, sem necessidade de adjetivos adicionais”, explicou Lanna.
Hoje, as duas compartilham sua mensagem de aceitação. “Algo que nossa experiência com Deus nos ensinou é que isso ninguém pode tirar de nós. Quem tem problemas com o nosso casamento ou com a nossa comunidade LGBTQIA+ é a igreja, não Deus. Ele nunca teve e nunca terá”, acrescentou.
Lanna e Rosania destacam que seu amor é, acima de tudo, um exemplo de fé e perseverança: “Não existe nada melhor do que hoje podermos dizer que, se por alguma razão você se sentiu excluído ou marginalizado, queremos lembrar que também já pensamos assim. Foi então que conhecemos a Deus, não apenas de ouvir falar, mas por meio de um encontro direto e transformador com Ele”.
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