Uma equipe médica chinesa realizou, em maio de 2024, o primeiro transplante de fígado de porco geneticamente modificado em uma pessoa viva. O paciente, de 71 anos, sofria de câncer hepático e cirrose, e sobreviveu por 171 dias após o procedimento. O caso foi divulgado nesta quinta-feira (9/10) na revista científica Journal of Hepatology.
O órgão suíno, com dez alterações genéticas destinadas a reduzir rejeições e aumentar a compatibilidade com o corpo humano, foi implantado sem a retirada total do fígado humano, atuando como suporte temporário. As modificações incluíam genes humanos que regulam a coagulação sanguínea e a resposta imunológica.
O fígado de porco produziu bile e proteínas essenciais, como albumina e fatores de coagulação, demonstrando atividade metabólica relevante e sem causar reações alérgicas ou falhas graves. Nos primeiros dias, o paciente apresentava sinais positivos: caminhava, produzia bile e mantinha funções hepáticas normais, sem sinais de rejeição aguda.
Contudo, após 38 dias, surgiram complicações de coagulação chamadas microangiopatia trombótica, o que levou à retirada do órgão transplantado. Nos meses seguintes, o paciente sofreu hemorragias recorrentes e faleceu no 171º dia após a cirurgia.
O procedimento integra a área de pesquisa dos xenotransplantes — uso de órgãos de animais para tratar humanos. Embora rins, corações e pulmões de porcos já tenham sido testados em pessoas com morte cerebral, esta foi a primeira vez que um fígado suíno foi utilizado como terapia de suporte em um paciente vivo.
O estudo destaca que, apesar das limitações, o enxerto funcionou por mais de um mês sem rejeição, representando um avanço importante. No entanto, os especialistas alertam que a aplicação clínica ainda está distante. Riscos como infecções por vírus suínos e questões éticas e sociais continuam sendo obstáculos significativos.
O editorial que acompanhou o artigo científico recomenda cautela, mas reconhece o potencial do transplante. A iniciativa também intensifica a disputa científica entre China e Estados Unidos pela liderança nos avanços em xenotransplantes, área que segue em estágio experimental, inclusive sob a administração do presidente Donald Trump.